Manifestações contra o presidente Jair Bolsonaro convocadas pelo MBL (Movimento Brasil Livre) e pelo VPR (Vem Pra Rua) ocuparão as ruas neste domingo (12) com adesões na oposição para além da direita, mas sem cumprir a meta de reeditar uma frente ampla inspirada na campanha das Diretas Já.
A principal resistência se dá no PT e em outros setores da esquerda que guardam mágoas com os dois grupos pelos protestos em favor do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) e se incomodaram com o mote "nem Bolsonaro nem Lula", depois atenuado, na divulgação dos novos atos.
Há passeatas previstas em 15 capitais do país, com foco especial dos mobilizadores para as cidades que tiveram grandes multidões na terça-feira passada, com as manifestações bolsonaristas do 7 de Setembro, que incluíram bandeiras antidemocráticas e discursos autoritários de Bolsonaro.
Em São Paulo, o objetivo é demonstrar a força da oposição e da defesa do impeachment na avenida Paulista, que recebeu no Dia da Independência 125 mil apoiadores do governo, segundo a Polícia Militar.
Para os organizadores, a nota de recuo publicada por Bolsonaro na quinta-feira (9), na qual buscou esfriar os ataques ao STF, em nada muda o fracasso do governo e o ímpeto golpista do presidente. A avaliação é a de que ele fingiu mais uma vez moderação porque está cada dia mais acuado.
"Quando seu adversário vira piada é ruim, porque as pessoas perdem o medo. Vamos continuar insistindo. A necessidade da manifestação continua premente, o golpismo não passou", diz Renan Santos, líder nacional do MBL.
Os protestos foram anunciados em 8 de julho, quando setores da oposição a Bolsonaro na esquerda já haviam organizado três grandes mobilizações. Os atos, que já chegaram a cinco desde maio, são feitos pela Campanha Nacional Fora Bolsonaro, que reúne partidos, movimentos e centrais sindicais.
As justificativas de MBL e VPR para não se juntarem às iniciativas do fórum, que é predominantemente de esquerda, foram as restrições impostas pela pandemia de Covid-19 e o baixo percentual de vacinados àquela altura, mas também pesaram divergências políticas e ideológicas.
A opinião dos movimentos foi a de que os atos serviam para alavancar a pré-candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
O tom radical de Bolsonaro e seguidores visto nas ruas na terça, em meio à escalada da retórica golpista, aos ataques à Constituição e a ameaças ao STF (Supremo Tribunal Federal), aceleraram a aglutinação em torno do dia 12, com o diagnóstico de forças políticas sobre a necessidade de uma resposta.
O MBL mencionou como inspiração, ao longo da semana, a pluralidade da campanha das Diretas Já, no fim da ditadura militar (1964-1985), quando antagonistas dividiram palanque em nome da luta por eleições diretas para presidente da República no Brasil.
De fato, a lista de partidos engajados na convocação cresceu. Inicialmente referendado pelo Novo e por alas do PSL, o ato passou a ser apoiado também por siglas como PDT, PSB, PC do B, Cidadania, PV e Rede, setores do PSDB e do Solidariedade e membros de legendas como MDB, DEM, PL, Avante e PSOL.
As cúpulas de PT e PSOL, hoje empenhadas na pré-campanha de Lula ao Planalto, decidiram não convocar para a data sob a alegação de que não participaram da construção desde o início, mas tampouco vetaram a presença de filiados. A deputada estadual Isa Penna (PSOL-SP) disse que irá à Paulista.
Como mostrou a Folha, interesses eleitorais dificultam a unificação do comando das mobilizações. Apesar disso, um grupo de nove partidos da oposição, inclusive o PT, fez um acordo para incentivar todo protesto contra Bolsonaro e se diz disposto a preparar atos conjuntos com a direita em outubro e novembro.
A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, afirmou em uma rede social: "Enquanto construímos esta grande manifestação de unidade pela democracia, pelo Brasil e pelos direitos do povo, incentivamos todos os atos que forem realizados em defesa do impeachment".
O PSOL divulgou nota para deixar claro "que o partido não é organizador, não convoca nem participará da manifestação", mas atua "para construir a mais ampla unidade para derrotar Bolsonaro" e não poupará esforços nessa direção.
A Campanha Fora Bolsonaro decidiu na sexta-feira (10) que sua próxima mobilização será no dia 2 de outubro. A eventual participação de setores externos, se for colocada, ainda terá que ser debatida.
Entidades e grupos que já estiveram nas ruas com a esquerda vão reforçar o dia 12, como os movimentos Acredito, Livres e Agora!, a UNE (União Nacional dos Estudantes) e cinco centrais sindicais: Força Sindical, UGT, CSB, NCST e CTB. A CUT (Central Única dos Trabalhadores), alinhada ao PT, não vai comparecer.
Presidenciáveis associados à chamada terceira via também anunciaram presença: Ciro Gomes (PDT), Luiz Henrique Mandetta (DEM), Eduardo Leite (PSDB), Simone Tebet (MDB) e Alessandro Vieira (Cidadania).
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), ainda avalia sua ida. Nas últimas semanas, o tucano propagandeou o ato deste domingo.
O tom de apoio da manifestação a uma candidatura alternativa a Lula e Bolsonaro em 2022 vinha fazendo parte dos materiais da convocatória para este domingo, mas, diante da irritação na esquerda e da tentativa de ampliar o público, foi deixado de lado nos últimos dias.
Os dois movimentos divulgaram notas afirmando que o mote do protesto é o impeachment, e não apoio à terceira via, e rechaçando o uso dos atos como palanque eleitoral.
"Convocamos todos os partidos, lideranças civis e agremiações, desde que respeitem a necessidade de deixarem suas pautas particulares e suas preferências eleitorais fora do ato, para nos unirmos pelo impeachment de um presidente golpista e autoritário", afirmou o texto do MBL.
O grupo informou ter feito concessões para atrair críticos do movimento. Um dos pontos de discórdia era o apelo para que partidos não levem bandeiras ou outros símbolos. O MBL diz que, para estimular a adesão, não ostentará faixas com sua logomarca no caminhão de som na Paulista.
"A gente está sendo bacana. Estamos fazendo um entendimento mútuo", diz Renan. "É uma demonstração de boa-fé ao tirar as bandeiras. A ideia é fazer um caminhão [de som] todo branco", segue ele, citando a cor que foi definida como a oficial da mobilização.
"Não estamos no clima de ser hegemonista. Cedemos, fomos supereducados. Ninguém vai poder falar nada do MBL."
Porta-voz do VPR, Luciana Alberto reforça o discurso de que a iniciativa será descolada de projetos eleitorais. "Agora é hora de a sociedade toda se mobilizar em torno de uma causa única, pelo 'fora, Bolsonaro'. O impeachment vai depender da pressão que a população exercer", diz.
Apesar das sinalizações, setores da esquerda se recusam a aderir a uma convocação planejada pelos dois movimentos, associados pelos detratores à ascensão de Bolsonaro e ao apoio acrítico à Operação Lava Jato, que deu margem a abusos judiciais –a prisão de Lula é o exemplo mais citado.
"Estão rotulando o MBL para constranger as pessoas de esquerda a não ir", afirma Renan.
Segundo o representante do MBL, as conversas para tentar atrair alas da esquerda e do centro ganharam impulso nas últimas semanas. Para ele, a procura de outros segmentos foi algo natural diante do diálogo que o grupo busca manter com uma ampla gama de siglas.
"Já havia uma receptividade ao ato do dia 12, uma predisposição. Mas o dia 7 facilitou isso, tornou natural comparecer. O 'fora, Bolsonaro' unifica muito", diz. Em junho, o MBL apoiou o superpedido de impeachment subscrito por partidos de oposição, ex-bolsonaristas e entidades da sociedade civil.
A situação do mandatário sofreu uma deterioração depois de terça, mas ele goza de um cenário confortável na Câmara dos Deputados graças à aliança política com o centrão. O presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), vem barrando a apreciação dos mais de cem pedidos de afastamento.
Renan afirma que o engajamento em redes sociais nas postagens sobre a manifestação e a quantidade de doações indicam que o ato será grande. A divulgação foi feita por meio de posts impulsionados, adesivaço em bairros de diferentes capitais e faixas incentivando buzinaços contra Bolsonaro.
Segundo o ativista do MBL, a data não foi escolhida por acaso. A ideia era reagir a uma esperada manifestação bolsonarista. "Teria que ter algo dia 7, a gente sabia. Eles sempre fazem atos em datas simbólicas", diz. O levante do Dia da Independência só começou a ser divulgado em meados de julho.
Embora tenha também a expectativa de um público significativo, a representante do VPR possui desde já uma resposta para o caso de o comparecimento ser abaixo do esperado.
"A parcela da sociedade que nós representamos ficou muito cautelosa durante a pandemia, não são pessoas negacionistas. Há um percentual grande de vacinados, mas muita gente tem medo da variante delta. Não sei até que ponto isso poderia impedir o cidadão de sair às ruas", diz Luciana.
Os chamados reiteram a obrigatoriedade de uso de máscara e recomendam distanciamento entre as pessoas.
"O que está claro é que a manifestação [do dia 7] mobilizou uma vertente da sociedade insatisfeita com o governo, mas que ainda estava silenciosa, observando", acrescenta. "O cidadão que estava meio adormecido acordou. O gigante está despertando novamente para se mobilizar, para se manifestar."
ATOS CONTRA BOLSONARO NESTE DOMINGO (12)
Número de atos
- 15 capitais terão atos (São Paulo, Brasília, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Fortaleza, Belém, Florianópolis,
Organizações envolvidas
- MBL (Movimento Brasil Livre)
- VPR (Vem Pra Rua)
- movimentos Livres, Acredito, Agora!
- UNE (União Nacional dos Estudantes)
- centrais sindicais: Força Sindical, UGT, CSB, NCST e CTB
Partidos envolvidos
- Novo
- PDT
- PSB
- PC do B
- Cidadania
- PV
- Rede Sustentabilidade
- instâncias internas e líderes de: PSDB, PSL, MDB, DEM, PL, Solidariedade, Avante e PSOL
Bandeira oficial
- fora, Bolsonaro
Locais em SP, RJ e DF
- São Paulo:
- Avenida Paulista, às 14h
Rio de Janeiro:
- Praia de Copacabana (Posto 5), às 10h
Brasília:
- Esplanada dos Ministérios, às 14h