Advogado Daniel Nascimento Ramalho destacou que a mesma Constituição que garante o direito de propriedade assegura também a função social desse direito. A declaração do advogado foi uma resposta às críticas feitas pelo deputado estadual Gilberto Cattani (PL), depois que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Flávio Dino, impediu a reintegração de posse na área ocupada do Contorno Leste.
Para Cattani, “o direito de propriedade em Cuiabá e no Brasil não vale mais nada. Que Deus tenha misericórdia da nossa nação”.
“A Constituição autoriza a desapropriação para fins sociais, porque ali existem famílias que necessitam de moradia. Esse ponto deve ser visto com o mesmo peso dado à reintegração”, afirmou em entrevista ao Jornal da Cultura o advogado que representa as famílias instaladas no Contorno Leste.
Ramalho é especialista em Direito Constitucional, Administrativo e mestre em Direito Agrário. Ele foi o responsável por ingressar com um mandado de injunção no Supremo Tribunal Federal, medida rara no ordenamento jurídico, que resultou na decisão do ministro Flávio Dino de suspender a reintegração de posse da área, prevista para 27 de outubro. O instrumento, criado pela Constituição de 1988 e fortalecido pela Lei nº 13.300 de 2016, foi utilizado diante da ausência de normas claras para tratar da situação de vulnerabilidade das famílias.
De acordo com o advogado, caberá ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), presidido pelo ministro Edson Fachin, editar uma norma para identificar famílias vulneráveis. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso também deverá adotar medidas em consenso para dar encaminhamento à questão.
Ele exemplifica que microempreendedores individuais e pessoas com antecedentes criminais foram excluídas da lista de vulneráveis.
A pauta mobiliza lideranças políticas. O deputado estadual Wilson Santos (PSD) articula com o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro (PSD), uma emenda de R$ 18 milhões para a desapropriação da área, de forma a acomodar as famílias. O senador Jayme Campos (União) e vereadores de Cuiabá também manifestaram apoio e devem apresentar emendas para auxiliar no processo de indenização dos atuais proprietários.
Antes da decisão do STF, a Prefeitura de Cuiabá havia se comprometido a identificar uma área para cerca de mil lotes. No entanto, segundo Ramalho, após a suspensão da reintegração não houve continuidade nas tratativas. Mesmo assim, ele se diz otimista.
“Com a pressão do governo federal e os recursos que estão sendo articulados, acredito que pode haver uma solução. Embora o governo federal tenha competência para desapropriar, o ideal seria que isso fosse feito pelo município, considerando as relações já estabelecidas pelo prefeito.”
A decisão do ministro Flávio Dino estabelece ainda que não pode haver a entrada de novas famílias na área. Para Ramalho, os atuais moradores ocupam o local por necessidade real de habitação, consequência da ausência de políticas públicas. “Nosso objetivo é garantir que essas famílias tenham seus direitos reconhecidos por meio das ferramentas legais disponíveis”.