AMBIENTE INTEIRO Sábado, 26 de Setembro de 2020, 09:35 - A | A

Sábado, 26 de Setembro de 2020, 09h:35 - A | A

PIOR INCÊNDIO DA HISTÓRIA

"O reerguer do Pantanal será tão ou mais trabalhoso que agora", diz ativista

Ambientalistas, artistas, representantes do Legislativo e da sociedade civil se reuniram em uma live organizada pela Cia Onze de Teatro para discutir as queimadas no Pantanal. O bioma já registra o número mensal mais alto de focos de incêndio desde o início da série histórica do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em 1998. Já houve 6.048 pontos de queimadas registrados entre 1º e 23 de setembro. O recorde mensal era de agosto de 2005, quando houve 5.993 focos.

“Esse encontro de múltiplas vozes teve como objetivo cobrar medidas efetivas para que algo seja feito pela preservação do Pantanal e dos outros biomas como o cerrado e a floresta amazônica”, frisou o ator Romeu Benedicto que fez as vezes de mestre de cerimônias do evento ocorrido no Cine Teatro Cuiabá e transmitido pelo YouTube.

Segundo o Instituto Centro de Vida (ICV) com base em dados da Global Emissions Fires Database, da Nasa, na porção mato-grossense do Pantanal o fogo já atingiu cerca de 1,7 milhão de hectares este ano, área que equivale a quase um terço do bioma no Estado.

Na opinião de Carla Martins, da Fundação Ecotrópica, além do combate aos focos de incêndio é preciso pensar nas fases posteriores ao controle do fogo.

“Mesmo que as queimadas sejam controladas há o reerguer do bioma, o que será tão ou mais trabalhoso que agora. Para o renascer do Pantanal são necessárias quatro temporadas de chuva, ou que significa pelo menos 8 anos”, observa.

A instituição atua na região no combate às queimadas e também no resgate aos animais ao longo da rodovia Transpantaneira até Porto Jofre, que faz divisa com Mato Grosso do Sul.

Já o biólogo voluntário Sérgio Freitas afirma que nunca viu uma tragédia ambiental tão grande durante os 20 anos em que atua na região pantaneira.

“Se não fosse a sociedade civil organizada não teríamos mobilizado o poder público na solução desse problema. Houve um lapso temporal, o governo demorou muito a agir. O Pantanal estaria queimando até agora se não fosse a ação dos voluntários. Há organizações sem equipamento, sem preparo, mas com muita coragem”.

Uma outra preocupação dos ambientalistas é com relação à água. Doutor em ecologia e professor da Universidade do Estado de Mato Grosso (Unemat), Hernandes Oliveira Jr. apontou a problemática da seca que já atinge o bioma.

“O Pantanal é sinônimo de água, de local alagável e está seco neste momento. A seca é uma dinâmica que acontece no Pantanal todos os anos, mas agora está intensificada. De 2008 a 2018 o Pantanal perdeu 16% da massa de água durante o período de estiagem, as baías estão deixando de se conectar com os rios, o que afeta a dinâmica da região e representa uma perda enorme para a biodiversidade”, salientou, alertando para uma piora da situação nos próximos anos.

Habitantes do bioma também ganharam voz no evento. Isidoro Salomão, um dos coordenadores do Comitê Popular do Rio Paraguai, em Cáceres, alertou para a necessidade de cuidar das nascentes como uma maneira de preservar e garantir que não haja perda de área alagada.

Ele lembrou ainda que é preciso olhar o Pantanal como um ser vivo que abriga animais e também pessoas que vivem e cuidam do bioma. Segundo Salomão, “o Pantanal não é apenas um área alagada e deve ser enxergado por inteiro”.

Esse olhar para os habitantes, os pantaneiros, foi um dos destaques da fala do fotógrafo José Medeiros, que passou mais de 40 dias na região registrando o modo de vida dos ribeirinhos e viu, de perto, o cenário de destruição causado pelo fogo. Suas imagens chocantes ganharam projeção nacional.

“A gente fala muito dos animais, mas não tem um olhar para as pessoas do Pantanal que estão passando por dificuldade por causa da pandemia”, frisou. “Há 25 anos fotografo o Pantanal e já vi queimadas, mas não como essa. Parece que a gente está entrando em um cenário de guerra, sente o cheiro da morte. As pessoas precisam prestar mais atenção ao ambiente em que vivemos, pensar sobre o mundo que queremos deixar para as próximas gerações. O Pantanal está queimando há quase 3 meses e agora é que as ações chegaram”.

Durante as falas dos participantes a punição aos responsáveis pelos focos de incêndio foi mencionada diversas vezes. A promotora de Justiça, Ana Luiza Peterlini, lembrou a existência de uma legislação, mas disse que empecilhos jurídicos e legais conduzem a uma série de impunidades.

“Ninguém se importa com a lei porque as penas que são aplicadas não dão em nada. Os crimes no Pantanal estão sendo investigados. Incêndios criminosos foram detectados e os responsáveis terão que reparar estes danos causados ao meio ambiente e à saúde da população”.

Representantes do Legislativo foram convidados ao debate. O deputado estadual Wilson Santos (PSDB) falou sobre o modelo de desenvolvimento equivocado no estado, que foca nas commodities e exclui a sustentabilidade e o meio ambiente.

Na opinião do também deputado Lúdio Cabral (PT) é necessário enfrentar com coragem estas questões ambientais para que o Pantanal não seja extinto. “É preciso enterrar de vez projetos como hidrelétricas na região pantaneira”.

O senador Wellington Fagundes (PL) também apontou as decisões tardias dos gestores como responsáveis pelo aumento no foco de queimadas no bioma.

“O Brasil é um país que não tem a tradição do planejamento, não pensa a longo prazo. A tecnologia está à disposição do governo, mas infelizmente não houve planejamento e as decisões foram tardias”.

A organização do evento convidou representantes do Executivo, mas eles não compareceram.



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