O presidente Jair Bolsonaro fez nesta terça-feira (17) um gesto de trégua ao Senado em meio à crise entre os Poderes. Disse reconhecer a independência do Legislativo e que não vai cooptar senadores para apoiar o pedido de impeachment dos ministros do STF Luís Roberto Barroso e Alexandre de Morares, que pretende apresentar ao Senado nesta semana.
Como mostrou reportagem do jornal Folha de S.Paulo, ministros palacianos entraram em campo nesta segunda-feira (16) para tentar convencê-lo a recuar da ideia de apresentar a denúncia contra os ministros do STF.
A tarefa de tentar apaziguar os ânimos coube principalmente ao chefe da Casa Civil e líder do centrão, Ciro Nogueira, mas também conta com o apoio de Flávia Arruda, ministra da Secretaria de Governo.
Ambos lideram a ala política do Palácio do Planalto e têm argumentado internamente que o gesto de levar ao Senado pedidos de afastamento contra os ministros, além de ser "inútil" do ponto de vista prático, tem potencial de piorar ainda mais a crise entre os Poderes.
Nesta terça, em entrevista à Rádio Capital Notícia Cuiabá, Bolsonaro repetiu a ideia de levar a denúncia contra os ministros do STF, sem recuar neste ponto, mas sinalizou uma trégua de que não vai pressionar a Casa para tentar encampar a ideia.
"Está com o senado agora. Independência. Não vou agora tentar cooptar senadores, de uma forma ou de outra, oferecendo alguma coisa pra eles, etc, para eles votarem o impeachment deles [ministros do STF]."
"Não vou fazer como o ministro Barroso fez, do TSE, que foi para dentro do Parlamento, reunir com lideranças partidárias e após a reunião, no dia seguinte, a maioria das lideranças resolveu trocar os integrantes da comissão por parlamentares que votaram contrário à PEC do voto impresso", continuou.
A PEC do voto impresso foi derrotada na comissão especial da Câmara e depois, numa manobra do presidente da Câmara e aliado de Bolsonaro, Arthur Lira (PP-AL), foi levada ao plenário. Lá, também foi derrotada -obteve 229 votos favoráveis, quando eram necessários 308 para sua aprovação.
Os ministros políticos do Planalto também têm defendido que a nova investida de Bolsonaro contra Barroso e Moraes, se confirmada, atrapalharia a governabilidade e ainda criaria novos obstáculos para as indicações de André Mendonça e Augusto Aras, que tramitam no Senado.
Os senadores deverão analisar o nome de Mendonça para uma vaga no STF e o de Aras para recondução na chefia da PGR (Procuradoria-Geral da República). Além disso, o governo ainda enfrenta a CPI da Covid no Senado, comissão onde um pedido de indiciamento do presidente já é dado como certo.
Apesar do aceno aos parlamentares, Bolsonaro manteve nesta terça-feira o tom de crítica aos ministros do Supremo. Disse que Alexandre de Moraes, do STF, estaria atuando fora da Constituição. Incluiu ainda no rol de alvos do Judiciário o corregedor-geral da Justiça Eleitoral, ministro Luís Felipe Salomão.
Em decisão na segunda-feira (16), atendendo a um pedido da PF, Salomão determinou às empresas que administram redes sociais que suspendam os repasses de dinheiro a páginas bolsonaristas investigadas por disseminar fake news.
"Ele [Moraes] está fazendo barbaridade, agora juntamente com o ministro do Tribunal Superior Eleitoral, o sr Salomão, que resolveu, numa canetada, desmonetizar certas páginas de pessoas que têm criticado a falta de mais transparência por ocasião do voto", afirmou Bolsonaro.
A fala sobre "barbaridade" de Moraes diz respeito ao fato de o ministro ter incluído o presidente como investigado no inquérito de fake news. Na entrevista dessa manhã, Bolsonaro questionou se ele faria diligência, busca e apreensão na sua casa: "Vai chegar nesse ponto?".
Bolsonaro foi incluído no inquérito pelo ministro no último dia 4, por ataque às urnas eletrônicas. A decisão ocorreu após o presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, ter enviado notícia-crime ao STF contra o mandatário por conta de mentiras ditas pelo presidente sobre o sistema de votação eletrônico em live.
O presidente disse na entrevista desta manhã, que durou mais de 40 minutos, que tem de agir "dentro das quatro linhas [da Constituição], apesar de alguns, como o senhor Alexandre de Morares, como o senhor Salomão do TSE, estão fora das quatro linhas".
Bolsonaro voltou a falar em ruptura, disse que ninguém quer isso. Uma ruptura, afirmou, traria problemas internos e externos, como barreiras comerciais, criando "caos" no país.
Mas concluiu: "Agora, onde é o limite disso? Eu sou leal ao povo brasileiro. O povo que tem que nos dar o norte do que devemos fazer", disse, citando as manifestações de apoiadores marcadas para o dia 7 de setembro.
Questionado pelo apresentador do programa de rádio a respeito do fundo público eleitoral para financiamento das campanhas, o presidente indicou que deve vetar integralmente a proposta, se não for possível vetá-la parcialmente para chegar num valor menor.
"Eu acredito que, desses R$ 5,7 bilhões [soma dos fundos eleitoral e partidário], meros R$ 3 bilhões deverão ser sancionados. Agora, vamos supor que não seja possível, porque está num artigo só. Então vete tudo. Essa foi a decisão", disse o presidente.
Técnicos da Câmara acreditam não ser possível veto parcial da medida, cabendo ao presidente apenas sancioná-la ou vetá-la.
Após a decisão de Bolsonaro, o Planalto reenviará o veto para o Congresso, onde pode ser derrubado. Se os parlamentares optarem por manter o veto, um valor menor poderá ser ajustado na peça orçamentária de 2022, que deve ser enviada pelo governo ao Parlamento em agosto.
O Fundo Eleitoral consta na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovada pelo Congresso em 15 de julho. O valor é superior aos R$ 2 bilhões disponibilizados para as campanhas no ano passado.
Na entrevista desta manhã, o presidente chamou a quantia aprovada pelo Congresso de "acinte". Ainda em julho, ele já havia sinalizado apoio à mudança, se ficasse no patamar de R$ 4 bilhões.
O presidente tem sido muito cobrado por seus apoiadores para vetar integralmente a medida. O gesto, contudo, deve desagradar parlamentares, que contam com volume maior de recursos para a campanha do ano que vem.
O texto foi costurado por lideranças do Centrão, incluindo o presidente da Câmara e aliado de Bolsonaro, Arthur Lira (PP-AL). Esses deputados compõe a base de apoio do governo na Câmara.