O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), acolheu a notícia-crime do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e decidiu investigar o presidente Jair Bolsonaro por suposto vazamento de dados sigilosos de inquérito da Polícia Federal sobre invasão hacker à corte eleitoral em 2018. Moraes mandou excluir a publicação do chefe do Executivo sobre o tema nas redes sociais.
Assim, o magistrado determinou a abertura de uma nova frente de investigação contra o chefe do Executivo e a instauração de outro inquérito para apurar a conduta do presidente. Moraes afirmou que o caso tem relação com o inquérito das fake news e, por isso, ele mesmo deve ser o relator do tema.
Na semana passada, Moraes já havia decidido incluir o presidente como investigado devido à transmissão de uma live em que prometia comprovar supostas fraudes nas urnas eletrônicas, mas, ao final, apresentou apenas um compilado de relatos já desmentidos anteriormente pelo TSE.
Nesta quinta-feira (12), a decisão do ministro foi uma resposta à notícia-crime assinada por todos os sete integrantes do TSE e enviada na última segunda-feira (9) ao Supremo.
Os ministros da corte solicitaram a apuração contra Bolsonaro e o deputado Filipe Barros (PSL-PR) por "possível conduta criminosa".
O processo foi motivado por uma publicação de Bolsonaro nas redes sociais feita logo após ele ter afirmado em entrevista a um programa da rádio Jovem Pan que comprovaria a fraude nas urnas eletrônicas.
Moraes, porém, mandou as empresas que administram as redes sociais excluírem as publicações sobre o tema. Além disso, determinou o afastamento do delegado Victor Campos, que levantou o sigilo do caso, da presidência do inquérito e mandou a direção da PF abrir um procedimento disciplinar contra ele.
Moraes também afirmou que o delegado e o deputado Filipe Barros deverão prestar depoimento à Polícia Federal sobre o caso.
O ministro deu cinco dias para a PGR (Procuradoria-Geral da República) se manifestar sobre o episódio.
"Ausentes, portanto, indícios de que as informações e os dados sigilosos e reservados do TSE tenham sido divulgados, com justa causa, inicialmente pelo delegado de Polícia Federal, e, na sequência, pelo deputado federal Filipe Barros e pelo presidente da República, Jair Bolsonaro", disse.
Moraes disse que a investigação do caso é "imprescindível" e que a publicação de Bolsonaro teve o intuito de "expandir a narrativa fraudulenta que se estabelece contra o processo eleitoral brasileiro, com objetivo de tumultuá-lo, dificultá-lo, frustrá-lo ou impedi-lo, atribuindo-lhe, sem quaisquer provas ou indícios, caráter duvidoso acerca de sua lisura".
O presidente disse que o inquérito da PF seria uma das provas de que as urnas são passíveis de fraude. Um dia depois, porém, o TSE desmentiu a versão de Bolsonaro e disse que o episódio, que ocorreu em 2018, "embora objeto de inquérito sigiloso, não trata de informação nova".
Na decisão desta quinta, Moraes afirma que as condutas noticiadas pelo TSE se revelam "conexas inseparavelmente" àquelas que já são objeto de apuração devido à live em que Bolsonaro mentiu sobre as urnas eletrônicas.
"Os elementos comprobatórios da existência de informações sigilosas ou reservadas pertinentes aos sistemas informáticos do TSE nos autos do mencionado inquérito policial foram devidamente destacados nesta notitia-criminis, a evidenciar claramente que os dados jamais poderiam ser divulgados sem a devida autorização judicial", argumenta o magistrado.
A decisão do ministro faz parte de um conjunto de ações do TSE, do qual ele também faz parte, e do STF para conter a ofensiva de Bolsonaro contra as instituições.
Depois de divulgar uma série de notas de repúdio e de fazer discursos duros contra o chefe do Executivo, o Supremo decidiu, após o presidente elevar as críticas contra o sistema eleitoral e fazer ameaças golpistas, partir para ações concretas.
No dia 2 de agosto, no primeiro dia de trabalho do judiciário após o recesso de julho, o TSE determinou, por unanimidade, a abertura de um inquérito para apurar as acusações de Bolsonaro, sem provas, de que o TSE frauda as eleições.
Na mesma data, Barroso assinou uma queixa-crime contra o chefe do Executivo e recebeu o aval do plenário da corte eleitoral para enviá-la ao STF.
Ambas as iniciativas ocorreram de ofício, ou seja, não contaram com a participação da PGR (Procuradoria-Geral da República), como acontece normalmente em investigações.
Além disso, dois dias depois, o corregedor-geral do TSE, ministro Luís Felipe Salomão, solicitou ao Supremo o compartilhamento de provas dos inquéritos das fake news e dos atos antidemocráticos com a ação que pode levar à cassação da chapa de Bolsonaro. Horas depois, em outra decisão, Moraes aceitou a queixa-crime de Barroso e incluiu Bolsonaro como investigado no inquérito das fake news.
Também nesta quinta, o ministro do STF Dias Toffoli cobrou do procurador-geral da República, Augusto Aras, uma manifestação sobre as alegações de Bolsonaro de que houve fraudes nas eleições de 2018.
O presidente já admitiu que não tem como provar as acusações que faz ao sistema eleitoral, mas tem insistido que o pleito vencido por ele foi fraudado.
Toffoli é relator de uma ação apresentada pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). Na ação, ele diz que Bolsonaro "tem repetido sistematicamente as acusações de fraude eleitoral sem demonstração de qualquer prova".
O parlamentar afirma ainda que o presidente pode ter incorrido em crimes contra a honra das autoridades eleitorais e jurídicas do país. "Além de crimes contra a honra, há o potencial cometimento dos crimes de responsabilidade", disse.
Vieira pede que o Supremo determine a Bolsonaro que apresente explicações sobre as afirmações de que houve fraude nas eleições de 2018 e de que sua vitória teria se dado ainda no primeiro turno, com o envio de provas documentais, e que aponte nominalmente os supostos responsáveis pela fraude.
A PGR foi comunicada sobre o caso durante o recesso do Judiciário, em julho, mas não emitiu parecer. Apenas manifestou que tomou ciência sobre a ação.
"Compulsando os autos, verifica-se, preliminarmente, a ausência de manifestação da Procuradoria-Geral da República. Com efeito, vê-se que os autos foram àquele órgão, em 27/7/2021, retornando em 04/08/2021, com a ciência do Procurador-Geral, sem parecer", disse Toffoli.
"Entendo imprescindível colher sua manifestação", prosseguiu o ministro do STF, referindo-se ao posicionamento de Aras.