O paradoxo de Mato Grosso reside no abismo que separa a pujança de seus números macroeconômicos da fragilidade de seu planejamento estratégico. Enquanto o Estado celebra uma arrecadação recorde de R$ 39,12 bilhões e ostenta a respeitável nota A em capacidade de pagamento, o diagnóstico técnico revela uma "erosão silenciosa". O alerta não é um ataque à gestão, mas um convite à reflexão institucional: não se pode sustentar o título de locomotiva se os trilhos estão corroídos pelo improviso.
A análise das contas de 2024 expõe uma vulnerabilidade que exige maturidade política para ser enfrentada: a excessiva dependência da volatilidade das commodities. No último ano, enquanto o Brasil crescia, Mato Grosso viu seu PIB retrair 3,4%, impulsionado por uma queda de 12,5% no setor agropecuário. Esse cenário demonstra que a robustez do caixa, embora real, é um ativo volátil que não substitui a necessidade de uma economia diversificada e de um orçamento pautado pelo realismo.
Um dos pontos mais sensíveis é o uso do patrimônio líquido e de superávits anteriores para cobrir déficits correntes, como o primário de R$ 1,7 bilhão. A analogia do fazendeiro que vende partes da terra para quitar contas mensais é pedagógica e precisa para o atual momento. É louvável que o Estado mantenha investimentos em logística, mas é alarmante que o saneamento básico tenha recebido apenas R$ 10,4 milhões, ignorando demandas básicas de dignidade humana.
A política de incentivos fiscais, que alcança R$ 10,65 bilhões, também demanda um olhar mais republicano e menos concentrador para o futuro do Estado. Ao destinar metade desses benefícios a apenas 30 grandes empresas em municípios já desenvolvidos, abdica-se de um potencial transformador em regiões carentes. Corrigir esse rumo e exigir contrapartidas sociais transparentes não é ser contra o setor produtivo, mas sim garantir que o retorno social seja equilibrado.
Mato Grosso é um gigante financeiro, mas o sucesso da próxima geração depende de pés firmes no planejamento e na execução de obras estratégicas. O veredito do Tribunal de Contas, ao aprovar as contas com ressalvas e determinações severas, é um chamado urgente ao realismo orçamentário. Respeitar as autoridades significa oferecer a verdade dos dados para que a saúde financeira do presente não se torne a insolvência estratégica do nosso futuro.






