O professor Roberto Santana da Silva tinha uma viagem marcada aos Estados Unidos em julho deste ano. Após a participação em um congresso internacional em Chicago, ele aproveitaria a ida ao país para passear por Nova York, com direito a uma “esticadinha” no Canadá. Com planos desfeitos por conta da pandemia do coronavírus, tanto o congresso quanto o passeio foram adiados para julho do próximo ano.
O professor é um dos muitos personagens da extensa cadeia do turismo que foi profundamente impactada pelas regras de isolamento social impostas a partir do surgimento das contaminações pelo novo coronavírus. O prejuízo é gigantesco e global.
No Brasil, por exemplo, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) estima o fechamento de 727 mil postos de trabalho no setor por causa dos impactos da pandemia. Os prejuízos vão além: R$ 87 bilhões em perdas acumuladas em apenas três meses.
Em Mato Grosso, segundo entidades do setor, mais de 95% dos hotéis tiveram o movimento afetado, com apenas 2% a 5% de taxa de ocupação, uma realidade que torna insustentável a manutenção de muitos destes estabelecimentos. Sendo assim, houve quem não suportasse a crise e optasse por fechar as portas de maneira definitiva, tanto em Cuiabá quanto em Várzea Grande.
O prejuízo não se resume aos hotéis e envolve toda uma cadeia formada ainda por agências de viagens, restaurantes, bares, casas noturnas e o setor de transportes como companhias aéreas e rodoviárias, táxis e aplicativos. Essa rede de agentes faz do turismo uma das maiores atividades econômicas do mundo.
Quem trabalha diariamente com o atendimento ao turista e viu os visitantes desaparecerem de uma hora para a outra hoje enxerga um cenário desolador. O guia de turismo Antônio Tadeu Marques de Oliveira estava no Pantanal quando a pandemia foi decretada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e conta que não conseguiu finalizar o tour. Os turistas, a grande maioria estrangeiros, foram embora da noite para o dia.
“Estava na baixa temporada, com menos movimento, mas ainda assim com a agenda lotada em maio e junho até o final de outubro. Tive que cancelar tudo, meu último trabalho foi em 18 de março e, depois disso, a pousada foi evacuada”, conta.
Antônio Tadeu está há 100 dias parado e revela que o impacto em sua atividade profissional não poderia ter sido pior. “Estou sem qualquer remuneração, apesar de ter tido ajuda de uma empresa onde eu trabalho, mas foi uma ajuda simples e não há qualquer previsão de retorno”, diz.
O guia está pessimista quanto a uma plena retomada das atividades esse ano, especialmente por conta da falta de uma vacina que imunize contra o vírus. “O turista estrangeiro é muito rigoroso quanto a isso, não vai sair do país dele se não houver algo nesse sentido”, completa.
A descoberta de uma vacina seria a “luz no fim do túnel” pela qual também espera o empresário Oswaldo Murad, proprietário da Pousada do Parque, em Chapada dos Guimarães, atualmente fechada por conta de decreto municipal.
Com bom movimento em janeiro e fevereiro e de olho na alta temporada, que vai de maio a novembro com presença maciça de estrangeiros, o empreendimento teve as portas fechadas em março e não há previsão de retomada do funcionamento, apesar de todas as medidas sanitárias impostas pelo proprietário.
“Esse ano não vem mais nenhum estrangeiro, então estamos nos adaptando. Trabalhamos mais na divulgação e fizemos algumas promoções de fim de semana, mas só podemos contar com o público local, de Cuiabá e interior de Mato Grosso, já que os voos também foram afetados”, diz. “Não há certeza de nada, a única certeza é a incerteza total”, complementa.
Em uma cidade essencialmente turística como Chapada dos Guimarães, se não há visitantes não existe alternativa de trabalho para os guias que fazem as trilhas pelas cachoeiras e outras atrações do Parque Nacional.
Para Luzia Abich, da empesa Amigos de Trilhas, o calendário mensal de visitações, com quatro trilhas aos finais de semana, foi
encerrado no dia 15 de março. “Sou professora e consigo garantir a renda em casa, mas se dependesse do trabalho com o turismo estaria à mercê do benefício público”, revela.
Planos para a retomada
Reunião online ocorrida no dia 17 de junho pela Secretaria Adjunta de Turismo de Mato Grosso (Seadtur) em parceria com o Sebrae MT teve a retomada do turismo em Mato Grosso como tema. Empresários, guias de turismo, presidentes de associações e gestores municipais puderam entender o panorama do setor para os próximos meses e pensar em soluções práticas.
A apresentação foi feita pela analista de negócios e gestora de Projetos de Turismo do Sebrae MT, Marisbeth Gonçalves, que mostrou pesquisa sobre o comportamento do turista após o momento de isolamento social.
“O turista tende a ser influenciado por novos hábitos, como higienização do local, sustentabilidade do atrativo, entre outros. A segurança sanitária será um fator determinante na decisão”, explicou.
A tendência, segundo a analista, é que os turistas busquem por viagens com períodos mais curtos em um primeiro momento, em destinos próximos e menor distância. Para o secretário de Desenvolvimento Econômico, César Miranda, será a oportunidade para que os mato-grossenses conheçam seu próprio Estado.
Destinos nacionais deverão ser os mais procurados após o fim do isolamento social como mostra pesquisa divulgada pela consultoria Cap Amazon e pelo portal Mercado & Eventos, que entrevistou mais de 400 agentes de viagem, categoria que representa 80% das vendas no setor do turismo.
Para 55% dos entrevistados, a retomada do turismo será mais rápida no mercado doméstico e já deverá ser percebida a partir de setembro. A procura por destinos nacionais também foi apontada como uma tendência, assim como o turismo de saúde e destinos menos frequentados.
O estudo também aponta uma possível mudança no perfil dos turistas brasileiros. Após o confinamento, agências esperam uma maior demanda de clientes em busca de viagens a lazer e para visitar amigos e familiares. Destinos e serviços que proporcionem bem-estar e contato com a natureza são citados, pela maior parte dos consultados, como segmentos em alta na retomada do turismo. (Com Assessoria)