Tem-se que o controle externo é uma atividade indispensável à democracia. Afinal, não há democracia se não houver o controle externo das ações gover-namentais, com autoridade e independência. Sua atuação sobre os próprios órgãos estatais desempenha importante papel nas relações entre estado e so-ciedade, contribuindo para a garantia do regime democrático.
A atuação fiscalizatória e sancionatória dos tribunais de contas em defesa dos valores democráticos encontra amparo nos incisos IV, VIII e IX do art. 71 da constituição da república. Relevante destacar que tal atuação permite o exame dos méritos das políticas públicas.
Sabe-se que todas as atividades dos jurisdicionados se encontram sujeitas a diversos controles, tanto pelo próprio povo, quanto por instituições do estado, especialmente constituídas para exercê-los. Sendo assim, denota-se a impor-tância do controle externo preventivo no âmbito dos tribunais de contas esta-duais.
Dentre tais competências existe a atuação pedagógica, uma das prerrogativas mais importantes, pois trabalha de maneira preventiva, ou seja, antes do sur-gimento das irregularidades públicas, evitando-se novos erros. O papel peda-gógico possui uma atuação didática e técnica, cuja proposta consiste no trei-namento, na orientação, na recomendação e na capacitação de todo o corpo de atores envolvidos nessa empreitada, ampliando a sua efetividade e possibilitando os diálogos interinstitucionais e com a coletividade.
Pode-se dar como exemplos de citada proposta os acordos celebrados por in-termédio de termo de ajustamento de gestão - TAG, as mesas técnicas, a cele-bração de seminários, cursos de capacitação e palestras, a divulgação de atua-lização jurídica, com ênfase nas alterações de leis e surgimento de jurispru-dências, o auxílio na avaliação de prioridades de gestão, a busca da eficiência de métodos e processos e, finalmente, o resguardo ao erário, principalmente diante das oscilações econômicas do momento pandêmico atual. Outrossim, torna-se oportuno, também, que os tribunais de contas busquem fomentar no-vas práticas de gestão, governança, compliance, accountability (prestação de contas) e também de controle das ações estatais.
O intuito principal do controle externo preventivo é criar um tribunal fortalecido, capacitado e efetivamente treinado para orientar a população e o jurisdicionado de maneira que o consenso possua um papel primordial, sobressaindo-se às sanções punitivas. Aliás, o resultado positivo do controle preventivo encontra respaldo na correção dos desvios e na concretização do interesse público, de maneira a guiar o jurisdicionado que, muitas vezes, desconhece a necessidade do aprimoramento da sua gestão e se deixa agir de maneira equivocada em busca, apenas, da fuga da sanção punitiva estatal que leva à rejeição de suas prestações de contas.
O estado de direito e a democracia são premissas essenciais para uma audito-ria governamental efetivamente independente. Sendo assim, visando traçar diretrizes que busquem guiar o futuro do controle externo brasileiro, as entida-des fiscalizadoras superiores (EFS), por meio da INTOSAI (Organização Inter-nacional de Entidades Fiscalizadoras Superiores), oficializaram dois gran-des documentos denominados “Declaração de Moscou” e “Carta de Foz” nos quais estão discriminados as propostas para o controle externo para os próximos anos.
A Declaração de Moscou possui os seguintes objetivos:
“• proporcionar controle externo independente sobre o atingimento de metas acordadas nacionalmente, inclusive daquelas vinculadas aos Objetivos de De-senvolvimento Sustentável (ODS),
• responder de forma eficaz às oportunidades decorrentes dos avanços tecno-lógicos,
• reforçar o impacto das EFS na accountability (a prestação de contas) e na transparência da gestão pública”[1]
Já a Carta de Foz busca:
“. Aproveitar as oportunidades trazidas pela revolução da informática para aprimorar os seus processos de trabalho e adequá-los às novas demandas sociais;
• Contribuir para o aprimoramento permanente da atuação do Estado co-mo promotor de políticas públicas;
• Estimular o diálogo interinstitucional, buscar atuação em rede, aproxi-mar-se da sociedade civil e promover um debate qualificado, baseado em evidências, com a premissa de defesa permanente do Estado De-mocrático de Direito; e
• Buscar permanentemente a realização de um trabalho que tenha impac-to social, alinhado às diretrizes emitidas pelas entidades representativas do controle externo.”[2].
Ambos os desafios visam o aumento do impacto das fiscalizações dos tribunais de contas na promoção da boa governança pública e melhoria do desempenho dos serviços prestados pelo estado.
Ato contínuo, importante destacar a atuação do tribunal de contas euro-peu, uma espécie de auditor externo/supervisor financeiro da União Eu-ropeia, cuja missão é a realização de auditoria independente, profissio-nal e com impacto, onde os desafios atuais e futuros com os quais depara são alcançados eficazmente.
Esclareça-se, inclusive, que a corte de contas europeia conduz iniciati-vas inovadoras de controle externo preventivo de grande escala que corroboram com a capacidade de resistência da União Europeia, a exemplo do quadro financeiro plurianual (QFP) do período 2021-2027 e a Next Generation EU; ambos consistem em planejamentos futuros de impulsionamento da recuperação orçamentária, cujo objetivo é ajudar a reparar os danos econômicos e sociais provocados pela pandemia do coronavírus, objetivando uma Europa mais ecológica, digital e resiliente, outrora preparada para os desafios atuais e futuros.
O controle externo preventivo do tribunal de contas europeu atua sub-metendo suas próprias contas às auditorias externas, realizadas por empresas privadas especializadas. Tal procedimento concede maior credibilidade às citadas contas perante os organismos que as controlam, quais sejam, os parlamentos e a sociedade, contribuindo para a melhoria da accountability democrática.
Falar de controle externo europeu é falar de futuro, de progresso e pers-pectivas. Afinal, a democracia participativa, inicialmente no âmbito social e previdenciário, alcançou notável desenvolvimento na Europa, cuja representação popular para uma gestão partilhada encontra respaldo para um controle externo preventivo voltado ao acolhimento da opinião popular.
Contudo, jamais pode deixar de evidenciar, também, a gradual evolução dos tribunais de contas brasileiros, cujo foco passou do controle de legalidade para, também, a positivação da vontade popular, caracterizando-se, sem sombra de dúvida, como forte fiscalizador das ações estatais, inibindo desvios e buscando concretizar as perspectivas dos cidadãos brasileiros e a garantia de seus direitos fundamentais, afinal, lembrando Sócrates: “aquilo que não puderes controlar, não ordenes”.