Sem uma política local de desenvolvimento bem definida ou alinhada à dinâmica econômica de Mato Grosso, Várzea Grande sofre há muitas décadas com o descompasso entre o crescimento populacional e a perda de capacidade produtiva. O déficit econômico tem reflexo direto na garantia de bem-estar social e de acesso a direitos básicos, como alimentação, saúde e educação.
Para se ter ideia do problema, 52% da população da cidade se encontra em situação de vulnerabilidade, sendo crianças e adolescentes, 37% desta porcentagem. Problema que não se restringe a Várzea Grande. No ano passado, Mato Grosso tinha 38% de seus cidadãos em situação de extrema pobreza, segundo dados do Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento (PNUD).
Isso significa que, em um dos estados mais ricos do país e um dos maiores produtores agropecuários do mundo, há 550 mil famílias em situação de vulnerabilidade, pobreza e extrema pobreza. Nestes casos, os rendimentos do trabalho são de até R$105 por pessoa do domicílio ao mês. Estamos falando de pessoas que não sabem quando ou se farão uma refeição.
Frente ao problema, a Comissão Permanente de Saúde e Assistência Social (CPSA) do Tribunal de Contas (TCE-MT) começa a abrir caminhos para que os políticos e a própria população se atentem à questão. O que esperamos com este movimento é garantir políticas de assistência social mais efetivas, que considerem a extensão do estado e as profundas diferenças socioeconômicas que marcam nossas regiões.
A atuação da Comissão também inaugura uma nova dinâmica na fiscalização sobre o setor, que, até então, não vinha sendo auditado. Ora, se ainda há um longo caminho rumo à equalização de acessos e à redução das desigualdades, de modo que ainda dependeremos de iniciativas assistencialistas por muitos anos, o Tribunal não pode se omitir. Estes investimentos, portanto, passam a ser monitorados mais de perto.
O desafio é imponente. Tomando Várzea Grande novamente como exemplo, observamos que a cobertura da demanda na rede preventiva de vulnerabilidades e riscos sociais do Sistema Único de Assistência Social já apresenta um déficit de 127%. Tal porcentagem confirma a urgência de nosso trabalho para a estruturação de uma política local de proteção social.
Mas os esforços devem alcançar outras frentes. Ou seja, é preciso ainda atenção sobre a geração de emprego e renda e sobre o desenvolvimento de estratégias que neutralizem efeitos transversais à pobreza, como aumento da violência, crescimento da população em situação de rua, da informalidade, o surgimento de doenças causadas pela alimentação inadequada, o preconceito e a exclusão social.
Esses déficits sociais não são novidade para nenhum gestor ou agente político. Ao mesmo tempo, são obstáculos muito maiores do que atores ou municípios, por si só, podem superar. O que buscamos é uma solução bem mais complexa, que esbarra em mecanismos de um sistema burocrático, desigual e injusto, característico da própria construção histórica e social do país.
É por isso que a Comissão tem foco em uma atuação conjunta e inteligente, que norteie as ações da administração pública para além da fiscalização de recursos, quase sempre limitados. Só assim é que as ferramentas destinadas ao provimento de saúde, assistência social, escolarização e segurança, entre outras, terão o devido alcance e poderão criar um cenário melhor para o futuro.